Racismo estrutural
“Racismo é a manifestação normal de uma sociedade, e não um fenômeno patológico que expressa algum tipo de anormalidade.” (Silvio Almeida)
Olá meu hambúrguer de feijão com purê de mandioquinha :)
Hoje o nosso papo será sobre o livro Racismo Estrutural, do famoso jurista Silvio Almeida. Eu, enquanto mulher preta e periférica, passei por uma imersão profunda conforme avançava nessa leitura.
Muitas pessoas pretas da classe média brasileira enfrentam um racismo velado, sendo que muitos não têm consciência desse processo. Todavia, entender as estruturas racistas que construíram a nossa nação é essencial para garantir a diminuição das desigualdades sociais, o enfrentamento à pobreza, o empoderamento do povo preto e a melhoria da qualidade de vida de pessoas pertencentes aos grupos que foram historicamente marginalizados!
“Eu não quero apenas ser o objeto de análise, mas quero ser o sujeito político com conhecimento intelectual para sustentar narrativas disruptivas.”
Talvez os meus anseios antirracistas sejam uma utopia neste presente século, mas sei que toda a transformação nasce de um sonho. Como diz a rainha Angela Davis em “As mulheres negras na construção de uma nova utopia”, a linguagem é um mecanismo de manutenção de poder, desse modo, mulheres negras podem utilizar suas vozes para romper com a cisão causada por um mundo desigual e desenvolver novos marcos civilizatórios, onde as perspectivas de gênero, raça e classe serão colocadas como alicerces para o desenvolvimento de uma sociedade justa e igualitária para todes!
Mas bom, vamos para o tópico central da nossa conversa: você sabe o que é racismo e quais as formas que ele se manifesta?
“O racismo é um fator estrutural, que organiza as relações políticas e econômicas baseado numa discriminação racial sistêmica contra a população negra.” (Silvio Almeida)
De acordo com Sílvio Almeida, o racismo é sempre estrutural, isto é, ele integra a organização econômica e política da sociedade de forma inescapável. Em outras palavras, o racismo fornece o sentido, a lógica e a tecnologia para a reprodução das formas de desigualdade e violência que moldam a vida social contemporânea.
O racismo é uma das práticas de desumanização mais perversa da história dos seres humanos! O colonialismo fundamentou a destruição de populações das Américas, África, Ásia e Oceania e isso trouxe um impacto profundo para a humanidade, reverberando nas estruturas sociais contemporâneas.
Para que a gente possa aprofundar a nossa conversa, é necessário trazer o conceito de alguns termos:
- Racismo: forma sistemática de discriminação que tem a raça como fundamento, e que se manifesta por meio de praticas conscientes ou inconscientes que culminam em desvantagens ou privilégios para indivíduos, a depender do grupo racial a qual pertencem.
- Preconceito racial: juízo baseado em estereótipos acerca de indivíduos que pertencem a um determinado grupo racializado, e que podem ou não resultar em práticas discriminatórias.
- Discriminação racial: é a atribuição de tratamento diferenciado a membros de grupos racialmente identificados, podendo ser direta ou indireta.
- Estratificação social: fenômeno intergeracional, em que o percurso da vida de todos os membros de um grupo social — o que inclui as chances de ascensão social, de reconhecimento e de sustento material — é afetado.
- Discriminação positiva: possibilidade de atribuição de tratamento diferenciado a grupos historicamente discriminados com o objetivo de corrigir desvantagens causadas pela discriminação negativa (a que causa prejuízos e desvantagens). Ex: políticas de ação afirmativa.
- Ações afirmativas: são políticas públicas de promoção de igualdade boa setores público e privado, e que visam a beneficiar minorias sociais historicamente discriminadas. Ex: cotas raciais, programas de valorização.
- Representatividade: participação de minorias em espaços de poder e prestígio social, inclusive no interior dos centros de discussão ideológica como os meios de comunicação e a academia.
De acordo com Silvio, há três convenções de racismo: individualista, institucional e estrutural.
- Individualista: é o racismo concebido como uma espécie de “patologia” ou anormalidade; é um fenômeno ético ou psicológico de caráter individual ou coletivo, atribuído a grupos isolados.
- Institucional: é o racismo no que se resume a comportamentos individuais, mas tratado como o funcionamento das instituições, que passam a atuar numa dinâmica que confere desvantagens e privilégios com base na raça.
- Estrutural: o racismo é uma decorrência da própria estrutura social; o racismo, como processo histórico e político, cria as condições sociais para que, direta ou indiretamente, grupos racialmente identificados sejam discriminados de forma sistemática.
Eu sei, a primeiro momento todos esses conceitos podem parecer complexos… Mesmo eu, sendo uma mulher negra, só fui “despertada” para a desigualdade racial ao meu redor quando passei a estudar o tema e a participar de discussões políticas!
Um querido amigo meu, Samuel Emílio, fez o desafio do Diário Antirracista de 30 dias, gravando uma série de vídeos para ajudar as pessoas interessadas no tema a aprofundar essas discussões. Confira o #04 vídeo:
“Em um mundo que a raça define a vida e a morte, não a tornar como elemento de análise das grandes questões contemporâneas demonstra a falta de compromisso com a ciência e com a resolução das grandes mazelas do mundo.” (Silvio Almeida)
Querido leitor, o racismo foi e continua sendo um elemento constitutivo da nacionalidade brasileira. Não podemos fechar os nossos olhos e declarar “somos todos iguais”, por que não somos! As oportunidades não estão distribuídas de forma igualitária, há privilégios e vantagens que faz com que ocorra uma relação de poder histórica contra grupos pertencentes às comunidades vulneráveis.
O racismo introduziu hierarquias, distinções e classificações de raças. Para reverter essa lógica é necessário que o Estado se posicione de forma assertiva. Nesse sentido, é fundamental que as instituições sociais sejam capazes de oferecer narrativas que acentuam a unidade social, apesar das fraturas como a divisão de classes, o racismo e o sexismo.
As políticas de ação afirmativas são uma ótima opção para aumentar a representatividade de minorias raciais e alterar a lógica discriminatória dos processos institucionais. Temos duas grandes conquistas na política brasileira:
- 10.639/2003, determina o ensino de história da África e cultura afro-brasileira em todas as escolas nacionais.
- Lei 12.228/2010, conhecida como estatuto racial, que no artigo 1 dispõe que o Estatuto é […] destinado a garantir a população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e as demais formas de intolerância étnica.
Esses marcos são preciosíssimos, mas não são suficientes. É necessário pensar em uma agenda desenvolvimentista, transformadora e democrática que inclua o tema das relações raciais!
A população negra constitui mais da metade da população brasileira! Diante de tal demografia, é impossível conceber a possibilidade de um projeto nacional de desenvolvimento que não enfrente o racismo no campo simbólico e prático.
Diversidade não basta, é preciso igualdade. (Silvio Almeida)
É essencial que a sociedade civil se aproprie desses conceitos, que as empresas abram vagas afirmativas e que nossos políticos criem políticas públicas com foco na população negra, legislando com uma base verdadeiramente antirracista.
Uma coisa tem que ficar bem escura: o racismo não é um problema meu, ele é um problema nosso! Que tal adotar essa temática como uma missão de vida, contribuindo para a construção de uma nação inclusiva, diversa e sustentável?
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Amanda Costa é ativista climática, jovem embaixadora da ONU, delegada do Brasil no G20 Youth Summit e em 2021 entrou para a lista #Under30 da revista Forbes. Formada em Relações Internacionais, Amanda empreende o PerifaSustentavel, atua como vice-curadora da comunidade Global Shapers (WEF), é colunista da Agência Jovem de Notícias e do Um só Planeta.