Os desafios de uma jovem mulher preta
Um dos meus maiores medos é me perder.
Esquecer quem eu sou, me distanciar do lugar de onde vim ou ser engolida pelo ego, disputas ou pelo próprio racismo.
Mas quando entro nessas piras eu paro, respiro e reflito.
Na imersão de pensamentos, percebo que outro medo também é não me perder. Ver o tempo passar e permanecer a mesma: manter os mesmos pensamentos, os mesmos sonhos e a mesma ingenuidade infantil que me fez chegar até aqui.
Acolho a minha história, valorizo a minha trajetória e escolho amadurecer.
Para estar onde estou (Dir. Executiva do Instituto Perifa Sustentável, Apresentadora do Programa de Televisão #TemClimaPraIsso? e Jovem Conselheira do Pacto Global da ONU) eu tive que transcender. Criei uma realidade paralela e acreditei num mundo imaginário onde havia espaço para que meus sonhos se tornassem realidade.
Frases como:
- Eu estou destinada à grandeza.
- Eu sou um sinal de Deus para esta geração.
- Eu nasci para desfrutar o melhor dessa Terra.
Fizeram parte da parede do meu quarto, moldando minha forma de pensar e influenciando as minhas atitudes.
Mas não quero permanecer no mundo imaginário, quero que a minha realidade interna transborde e vire verdade não só para mim, mas também para os meus. Navego num realismo otimista, entendo que é possível ver o mundo como ele realmente é e criar o mundo que eu realmente sonho.
Sinto que passeio por diferentes universos: quebrada X espaços de poder.
Sou da Brasilândia, uma das maiores periferias de São Paulo, mas como Jovem Embaixadora da ONU, acompanho algumas discussões globais, como a Conferência de mudanças climáticas da ONU, a COP 27 — Egito.
Diálogo com grandes tomadores de decisão, faço política a nível internacional e comunico os perrengues nada chiques no meu instagram (@souamandacosta) e Linkedin.
Essa COP foi intensa, complexa e desafiadora.
Completei o trabalho, mas muitas coisas mudaram dentro de mim.
Ao mesmo tempo que desejo ser uma referência para a minha quebrada, me pergunto se vale a pena pagar o preço. Percebo que tem uma galeeeeera se degladiando para conquistar esse lugar, almejando status, dinheiro e poder.
Esse não é o mundo que acredito, mas tudo é tão intenso que sinto medo de ser cooptada. Não dá mais para ser ingênua e fingir que essas coisas não existem, mas também não quero jogar o jogo.
Não há espaços para vitoriosos nessa lógica, somente dores, tristeza e frustrações.
Apesar das feridas, agradeço a oportunidade de viver esse momento e refletir sobre ele. Parar, pensar criticamente sobre os processos que me atravessam e entender os impactos que eles me causaram, me causam e ainda vão me causar.
Reposicionamento e realinhamento.
Lembro do meu propósito e escolho permanecer firme. Eu sei o que quero, e por mais que sinta medo, não vou desistir. Quero…
- mobilizar a juventude para criar uma nova agenda de desenvolvimento para o Brasil, trazendo as perspectivas de raça e clima.
- apoiar jovens pretos e periféricos para que ocupem espaços junto aos tomadores de decisão.
- desenvolver projetos de transformação territorial para as quebradas, favelas e comunidades.
Para isso, escolho construir relações baseadas em verdades, sem disputas de ego, entendendo que há espaços para todos quando temos objetivos em comum.
Talvez eu me perca durante o processo? Talvez.
Mas alinho a rota e prossigo em direção ao alvo. Tenho apenas 26 anos e estou num processo contínuo de aprendizagem, reflexão e amadurecimento.
E quando me questionam sobre as minhas decisões, ecoo a letra da música “Se o Caminho é Meu”, da Dona Ivone Lara:
Se o caminho é meu, deixa eu caminhar, deixa eu. Se o caminho é meu, deixa eu. Se o caminho for de pedras, sou eu que vou tropeçar. Se o caminho for de agruras, eu que vou me amargurar. Se o caminho for de espinhos, sou eu quem vou me espetar. Se o caminho for de rosas, eu que vou me perfumar.
Amanda Costa é ativista climática, jovem conselheira do Pacto Global da ONU, fundadora do Instituto Perifa Sustentável e apresentadora do #TemClimaParaIsso?, um programa sobre crise climática. Formada em Relações Internacionais, Amanda foi reconhecida como #Under30 na revista Forbes, TEDx Speaker, LinkedIn Top Voices e Creator e em 2021 foi vice-curadora do Global Shapers, a comunidade de jovens do Fórum Econômico Mundial.