Me descobrindo negra

Amanda da Cruz Costa
3 min readOct 14, 2019

Hoje completo 23 anos, mas sou negra há apenas 7 meses. Antes eu era moreninha, mulata, parda ou cor de bombom. Me descreveram com todos os eufemismos possíveis, mas eu não preciso de eufemismo!

Sou negra e ocupo um espaço de vantagem social na sociedade. Aos 23 anos, viajei para 6 países, participei de 2 conferências das Nações Unidas (ONU), sou Global Shapers do Hub SP (Fórum Econômico Mundial), líder em mudanças climáticas pelo Youth Climate Leaders (YCL) e líder em sustentabilidade pelo United People Global (UPG).

É difícil reconhecer que negros não são sempre miseráveis e não estão sempre em posições subalternas?

Apesar dessas conquistas, foi difícil me declarar negra. Há um estigma social causado pelo racismo, intensificado pela percepção de que somente as pessoas de pele retinta e cabelo crespo são realmente negras. Muitas vezes, sou a única negra nos espaços em que transito e talvez seja esse o motivo de ouvir que não sou negra, sou moreninha.

Eu fui branqueada em casa, na escola, nos clubes e na universidade. Aos olhos de uma sociedade que caracteriza a beleza branca como superior e dominante, ser preta e ter o cabelo crespo não contribuía para a minha inserção nos grupos sociais.

Precisamos contestar o padrão de beleza imposto e problematizá-lo. Os laços de dominação colonial não foram totalmente rompidos, ainda reverbera uma imposição cultural que caracteriza o “não-branco” como inferior.

Quando minhas reflexões sobre raça, classe e gênero começaram, tive a “epifania da negritude” e percebi o quanto a minha existência havia sido embranquecida. Se queremos transformação social, precisamos questionar os padrões dominantes!

Mas será que mulheres negras podem ser intelectuais? Escritoras? Ativistas climáticas? Líderes em sustentabilidade? Internacionalistas?

No senso comum, a mulher negra não pode ser referência, protagonista ou especialista em algum tema específico. E se ela ocupa essa inusitada posição, espera-se que ela permaneça em silêncio e não conteste o sistema social vigente.

Mostrar-se diferente é um ato de OUSADIA!

Decidi me rebelar e compartilhar a minha história, seja na minha narrativa, nas minhas roupas/acessórios ou simplesmente como corpo negro pensante, analisando a negritude a partir de uma perspectiva existencialista!

Contar a minha história passou a ser um ato fundamentalmente político, assim como expressar a minha identidade como mulher negra e periférica.

“Na minha busca pela identidade descobri o turbante. Quando coloco o pano na cabeça, me sinto no controle, conectada a uma multidão de mulheres que vieram antes de mim.”

Debater o racismo e a identificação racial no Brasil ainda é difícil e tem o peso do silenciamento. É preciso muita coragem para olhar o passado, buscar respostas e enxergar-se como negro.

Mas não sou corajosa sozinha, a cada letra que escrevo trago uma força coletiva com potencial para gerar mudanças significativas. Da mesma forma que meu corpo guardou a cor da pele, minha ancestralidade afro guardou a negritude como herança genética.

E hoje, aos 23 anos, decidi ser protagonista e contar a MINHA história!

Amanda Costa é estudante de Relações Internacionais, empreende o Climathon Brasil e o PerifaSustentável, coordena o Grupo de Trabalho sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (GT ODS) no Engajamundo, é facilitadora da Plant-for-the-Planet, participa das redes Global Shapers Community, United People Global (UPG) e Youth Climate Leaders (YCL).

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Amanda da Cruz Costa

#ForbesUnder 30 | Conselheira Jovem da ONU | Dir. Executiva do Perifa Sustentável