Estado e Colonialidade do Poder
Aula 07 da disciplina de Estado, Mudança Social e Participação Política, do prof Dennis de Oliveira (USP)
Olá minha lindeza climática ❤
Discutir Estado, Hegemonia, Poder, Política, Colonialidades, e Capitalismo foi uma experiência intrigante. No começo do ano decidi aplicar como Aluna Especial da Universidade de São Paulo e posso garantir que a minha cabeça ficou assim com o desenrolar das aulas 🤯🤯🤯.
Nesta aula, o prof Dennis de Oliveira estava num congresso na Colômbia, portanto nos encontramos de forma virtual. Ele deu ínicio ao conteúdo com uma reflexão de território, ressaltando que dentro da academia há um certo eurocentrismo e apesar dos conceitos de Marx, Weber, Rousseau, Kant serem imensamente importantes, precisamos levar em conta o lugar que eles falam e as experiências que tiveram em todas as nossas análises.
“Há uma necessidade de pensarmos e termos uma visão dialética da modernidade. A modernidade nas obras das ciências sociais é apresentada como algo positiva, revolucionária. E de fato ela foi, na experiência europeia medieval. A passagem do sujeito teocêntrico para o antropocêntrico, a racionalidade tomando lugar, as pactuações e contratos sociais… Todos esses elementos que fazem parte do paradigma da modernidade foram importantes, mas chegaram na América Latina de forma opressiva, sob jugo da colonização europeia. Então não dá para pensarmos que a modernidade na América Latina tem o mesmo jugo da experiência europeia.” (Dennis de Oliveira)
Cara leitora, é fundamental chegarmos numa construção dialética nossa, que parta do sul global, que seja latina. Os pensadores das teorias pós-coloniais são essenciais neste processo, pois apresentam uma perspectiva teórica que possibilita o desenvolvimento de uma visão ampliada.
Qual o significado das obras clássicas europeias na América Latina?
Existe um conjunto de pensadores do nosso continente que fazem contrapontos, e focam em fatos específicos como relação racial, étnica, colonização, gênero, configurações do sistema do mundo capitalista, etc. Os principais autores que estudaram o tema são:
- Aníbal Quijano (17 de novembro de 1930–31 de maio de 2018): foi um sociólogo e pensador humanista peruano, conhecido por desenvolver o conceito “colonialidade de poder”. Seu corpo de trabalho tem sido influente nos campos dos estudos coloniais e da teoria crítica.
- Walter Mignolo: (1 de maio de 1941): é um semiólogo argentino e professor de literatura na Universidade de Duke, nos Estados Unidos. É conhecido como uma das figuras centrais do pensamento decolonial latino-americano e como membro fundador do Grupo modernidade/colonialidade.
- Enrique Dussel (24 de dezembro de 1934): filósofo argentino radicado (exilado) desde 1975 no México. Um dos maiores expoentes da Filosofia da libertação e do pensamento latino-americano em geral. Autor de uma grande quantidade de obras, seu pensamento discorre sobre temas como filosofia, política, ética e teologia. Tem se colocado como crítico da pós-modernidade, chamando por um novo momento denominado transmodernidade. É um famoso crítico do pensamento eurocêntrico contemporâneo.
- Samir Amin (3 de dezembro de 1931–12 de agosto de 2018): foi um economista egipcio neo-marxista, um dos mais importantes de sua geração. Realizou seus estudos sobre política, estatísticas e economia em Paris. Destacou-se por seus trabalhos acerca do sistema-mundo.
“A colonialidade de poder é o lado obscuro da modernidade.” (Michael P Ghiglieri)
Até o século XVI (antes da colonização das américas), nós tínhamos um mundo policêntrico (havia diversos centros hegemônicos pelo mundo). Isso se modificou com a colonização das Américas, a qual inaugurou a ideia de um mundo unificado (sistema mundo). Foi neste período que a Europa começou a se consolidar como centro do mundo e alguns processos de padronização foram criados, como a padronização econômica (forma de produção de riqueza europeia virou referência para o mundo), e portanto, a padronização epistêmica.
“Essa padronização econômica vai desembocar no capitalismo, que nasce como uma potencialidade de ser universalizado.” (Dennis de Oliveira)
Existe uma padronização epistêmica, no qual a racionalidade moderna (razão instrumental voltada para a reprodução do capital) passou a ser a referência do pensamento. Todo o padrão de racionalidade, a razão que se constitui como elemento central da sociabilidade do capitalismo, passou a ser a referência de capitalismo para o mundo todo.
É no mundo globalizado que a unificação se consolida. Este novo universo se realiza pelo capitalismo neoliberal, que busca a total desregulação dos fluxos de produção, a desregulação do trabalho e a concentração de poder em algumas corporações internacionais. Com isso, a conquista das Américas criou uma nova concepção de espaço, uma expansão da Europa. Num sentido geral, a América já existia, mas passou a ser mapeada e nomeada a partir dos processos de colonização.
Modernidade e colonialidade
“Entre os dois cenários descritos acima surgiu a ideia da “modernidade”. Apareceu primeiro como uma colonização dupla, do tempo e do espaço. Estou também argumentando que a colonização do espaço e do tempo são dois pilares da civilização ocidental. A colonização do tempo foi criada pela invenção renascentista da Idade Média, e a colonização do espaço foi criada pela colonização e conquista do Novo Mundo. No entanto, a modernidade veio junto com a colonialidade: a América não era uma entidade existente para ser descoberta. Foi inventada, mapeada, apropriada e explorada sob a bandeira da missão crista”. (Mignolo, 2001)
Conceitos principais:
- Enrique Dussel fala que o Ego cogito (Penso, logo existo) de Descartes vem na sequência do Ego conquisto (Eu conquisto, eu penso, logo existo)
- O momento da emergência da racionalidade moderna é a transfiguração da alienação metafísica do discurso mítico/religioso para a alienação mercantil do capitalismo (Samir Amin). Por isto, o eurocentrismo é a base da transformação cultural do capitalismo: a religião é superada pela racionalidade aliada à visão do mercado para a compreensão da realidade.
- Amin e Dussel defendem que o mundo policêntrico até o século XVI tinha os impérios médio-orientais como centro (pela sua maior estruturação da centralidade política) como o Império Otomano. A tradição helênica se dispersou por várias experiências societárias mas foi “europeizada” a partir das conquistas europeias: sai de uma especulação especulativa para uma especulação metodológica (não só sabe o que sabe, mas sabe como saber).
Com isso, a ciência moderna passa a ser ligada à perspectiva de uma aplicação prática para possibilitar o aumento da reprodução do capital. Antes, na Grécia Antiga, a ideia de conhecimento estava ligada a uma ideia de contemplação, com o intuito de entender e contemplar o Universo. Essa tradição clássica européia é diaspórica e será apropriada por outras civilizações. Portanto, para Dussel, o eurocentrismo restringe a perspectiva histórica do conhecimento, sendo caracterizada por ser uma ideologia.
“Eurocentrismo não é a Europa enquanto Europa, mas sim uma narrativa ideológica, uma visão constituída que tem como objetivo sustentar a hegemonia de uma certa tradição europeia que se coloca como hegemônica.” (Dennis de Oliveira)
Consequência: matriz colonial do poder (segundo Mignolo)
- Classificação racial (origem na Espanha cristã medieval)
- Padrão global de classe (com base no capital — inicio séc XVI)
- Divisão Internacional do Trabalho
- Sistema inter-estatal de organizações político-militares comandadas por EUA e Europa (ex: Otan)
- Hierarquia racial-étnica
- Hierarquia de gênero
- Invenção da classifição (hierarquizada) de heterossexual/homossexual
- Hierarquia espiritual/religiosa
- Hierarquia estética
- Hierarquia epistêmica
- Hierarquia linguística
- Concepção particular de “sujeito moderno"
O que chamamos de colonialidade de poder pode ser expressa pelo que o Miolo chama de Monstro de 5 cabeças e dois pés. As cabeças são os 5 controles (economia, autoridade, natureza e recursos naturais, gênero e sexualidade e subjetividade do conhecimento). E dois pés sustentam isso, que é o fundamento racial do conhecimento e o fundamento patriarcal do conhecimento. Veja a figura abaixo:
Já Nelson Maldonado Torres, apresenta uma proposta analítica (diagrama) de como seria essa colonialidade. Numa ponta há a colonialidade de poder, se expressa como uma estrutura social e política, perspetiva a cultura. Na outra ponta há a colonialidade do ser, e em baixo há a colonialidade do ser, marcada pela dimensão de espaço e de tempo. Essas três colonialidades (poder, saber e ser) constroem uma perspectiva de subjetividade. O sujeito colonizado é produto de uma dimensão de poder, de uma dimensão de saber e de uma dimensão de ser. Os objetivos são exploração, dominação, expropriação, extermínio, naturalização da morte, torutra e estupros.
Como ação reativa, o Nelson Maldonado Torres propõe a colonialidade, que é tanto uma crítica a estrutura política quanto ao sistema hegemônico europeu:
Raça como categoria epistêmica do padrão colonial de poder
- Raça como elemento classificatório (Brancos = europeus; Indígenas = povos originarios da America; Negros = africanos
- Branquitude normativa = eurocentrismo como projeto universalizante
- Para Samir Amin, o eurocentrismo é o arranjo cultural do capitalismo, portanto a branquitude normativa é a essência do capitalismo
- Por isto, a raça como elemento classificatório se transforma no filtro de acesso aos regramentos políticos, sociais, de trabalho e mentais do capitalismo
Ufaaaa! Chegamos ao fim da série de artigos sobre as aulas da disciplina de Estado, Mudanca Social e Participação Política. Foi uma jornada tanto rs. Espero que esse resuminho te ajude a ampliar a sua visão de mundo e entender conceitos importantes, querida leitora.
Caso queira revisar algum artigo, é só clicar:
- Aula 01: Dei o primeiro passo para me tornar uma pesquisadora acadêmica
- Aula 02: O avanço do neoliberalismo
- Aula 03: Democracia para quem?
- Aula 04: As contribuições de Antonio Gramsci sobre hegemonia
- Aula 05: 18 de Brumário de Luís Bonaparte
- Aula 06: Ação Direta do Capital
- Aula 07: Estado e Colonialidade do Poder
Qualquer dúvida, só escrever nos comentários e bora trocar ideia ❤
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Ativista climática, jovem conselheira do Pacto Global da ONU e fundadora do Instituto Perifa Sustentável. Formada em Relações Internacionais, Amanda foi reconhecida como #Under30 na revista Forbes, Revista Época Negócios, Pequenas Empresas Grandes Negócios e Marie Claire. Além do mais, Amanda é TEDx Speaker, LinkedIn Top Voices, LinkedIn Creator e já participou de 5 conferências oficiais da ONU sobre mudanças climáticas, sendo elas COP 23 — Alemanha, COP 24 — Polônia, COP 26 — UK, COP 27 — Egito, COP 28 — Emirados Árabes.